Publicado por werneck2017
Autorretrato – As Contistas
Falar de si demonstrou ser um exercício árduo, como desnudar-se diante de pessoas com as quais não se tem ainda a intimidade desejada. Mas diante de relatos tão singelos e verdadeiros, não podia furtar-me a ele. O que melhor me define (desde que me entendo por gente) é a busca incessante, a nível pessoal ou profissional. Então começo por esse viés.
Em busca da beleza, lancei-me inicialmente ao desenho. Ingressei adolescente na faculdade de Arquitetura da USP, que me deu o entendimento da arte, do equilíbrio entre espaços, da harmonia das cores e luzes. Não cheguei a terminar o curso.
Em busca do amor, lancei-me à construção de uma família. Marido e três filhos maravilhosos que me foram dados por Deus e que enriqueceram minha vivência e entendimento das coisas. Ciclos se iniciaram e se fecharam, chegamos e saímos de cidades, laços foram feitos e desfeitos, até finalmente morar em Manaus, no extremo do país.
Em busca de conhecimento, estudei línguas. Formei-me professora de inglês, flertando também com o francês, por ter vivido um curto período de tempo em Caen, na Normandia francesa. Tornei-me Mestre em Letras, com foco em estudos da Linguagem, pesquisando o vocabulário de migrantes no interior do Amazonas e sua variação quando eles se mudam para a capital. Foi quando ouvi suas estórias, suas (des)esperanças, suas vozes que não mais me abandonaram. Encantada, sucumbi à magia da região e às vozes que formam o povo amazônico.
Em busca de um outro olhar, lancei-me à escrita. Um processo solitário, mas libertador, onde se pode proporcionar uma experiência emocional gratificante, não só ao leitor, mas também ao autor. A ficção proporciona divertimento, mas também denuncia injustiças, fala do bem e do mal, pobres e ricos, brancos e pretos. A literatura é democrática e, para exercê-la, conto com o apoio incondicional de marido e filhos.
Em busca de aprimoramento, ingresso com as amigas nessa jornada. É com grande expectativa que abraço nosso recanto me deleitando com tantas estórias, com tantos mundos diferentes, com tantas experiências que se complementam. Que nosso blog só venha a agregar. Fui agraciada com Menção honrosa no Prêmio Casa de Las Américas 2019 pelo livro Orelha lavada, Infância Roubada (publicado pela editora Oito e Meio), Premio Cidade de Manaus (2019) com o livro O verso do Reverso como melhor livro de contos regional e Premio Cidade de Manaus (2020) com Tocaia do Norte, melhor romance nacional.
Ver todos os posts por werneck2017
Minha querida Sandra. Sua poesia é enigmática, então, mesmo assumindo o risco de fracassar miseravelmente e me armando da mais suicida coragem, eu resolvi cometer uma interpretação.
Por um segundo, escuta
O que já não cala,
O que já não cessa,
O que já é choro e
Ranger de mágoa
A indiferença ignora a dor do outro, mas, por um segundo apenas, consegue perceber, e talvez se incomode, com aquela voz que não cala, aquela dor que não cessa, o ranger da mágoa. Mas aí me ocorre que o seu eu lírico está ouvindo a si próprio, não conseguindo mais deter a mágoa que tenta desesperadamente conter em seu ferido coração.
Por um segundo, vê
O que já não viceja,
O que já é vazio
A engolir o mundo,
tão vil
Que já não o alcanço
Tão vago
Que já não o habito.
Nesta parte, aquilo que incomodava já perdeu a força, mas ainda é lembrança. A pessoa desistiu, deixou para lá e colocou o preço desta desistência na conta da maldade do mundo.
Por um segundo, sente
A dor que grassa
A tristeza que enlaça
A fome que devora
O abandono que decreta
Os tempos insepultos
Das carnes já mortas.
Aqui a perspectiva se torna mais holística, estamos falando de um perceber do que está ao redor, que é terrível e inevitável. A dor do mundo,
Obrigada pelo texto e isso foi o que consegui captar. Um beijo, querida.
CurtirCurtir
rindo aqui do seu drama expresso no primeiro parágrafo. Eu gostei da sua interpretação.
CurtirCurtido por 1 pessoa
rsrsrs. Eu assumindo minhas limitações intelectuais.
CurtirCurtir
Olá, Iolandinha!
tenho visto e ouvido tantos descalabros, tantas mortes, tanto descaso que consegui por meu sentimento de desalento no poema. Quem não tem empatia diante de tantas mortes e absurdos ´´e porque já não é um ser humano, não é? Obrigada pela leitura!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Sandra Godinho faz da literatura forma de dialogar com o mundo. Vive a intensidade da palavra e sabe como poucos manejá-la, para criar o seu ouvir e o seu falar com a vida, o seu lamento pelos mais desafortunados.
As palavras, aqui, são carregadas ao máximo de sentidos, de riquezas conotativas, abrindo para o leitor imenso campo de recriação, através das sugestões apresentadas. Há predominância, no poema, do denso, do pesado, da palavra dura, mas em ritmo leve e musical dos versos curtos.
Parabéns pela autenticidade de suas expressões. Beijos.
CurtirCurtir
Olá, Fátima!
Como eu admiro o seu retorno, sua análise das nuances e das camadas de um texto e/ou poema, gênero que estou tateando ainda. É a minha revolta contra a insensibilidade de tantos diante de tantas mortes e descalabros. Obrigada por sua leitura e comentário! Bjos
CurtirCurtir
Maravilhoso, Sandra. Versos curtos ue dizem muito. Você escreve com o coração, escolhendo muito bem as palavras cheias de força e significado. Admiro esse seu engajamento com a escrita que grita. Beijos e parabéns.
CurtirCurtir
Olá, Fernanda! É minha revolta contra a insensibilidade de tantos diante de tantas mortes. Que as palavras gritem, não é? Obrigada pelo seu retorno e leitura! Bjos
CurtirCurtido por 1 pessoa
Sim, necessário com certeza. E vc faz com maestria 💋
CurtirCurtido por 1 pessoa
Sandra, querida, seu poema me soou como um apelo à sensibilização para a dor do mundo. Ouvir e enxergar a miséria que tristemente nos cerca ainda que por um breve segundo. É um poema forte e contundente cuja dicção se insere no que eu vejo como seu projeto literário, engajado e aguerrido, que eu tanto admiro, sobretudo pela coerência. Sucesso sempre, querida. Um beijo..
CurtirCurtir
Olá, Elisa!
Vc conseguiu captar bem, minha amiga. É minha revolta contra a insensibilidade de tantas pessoas diante de tantas mortes e casos de corrupção que estão acontecendo à nossa volta. Arrisquei-me a escrever um poema. Obrigada pelo seu comentário certeiro e sua leitura. Bjos
CurtirCurtir
Um poema sobre nossos dias, nossas desgraças, nossa desolação? A mim assim soou. E fez todo o sentido, e tudo foi sentido, já que sentir é o que nos resta fazer…
Suas palavras, como sempre, mexendo comigo.
Um beijo, querida, e parabéns!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Oi, Gi! Você disse bem, sentir é o que nos resta, lutar com as palavras é nossa arma diante de um mundo pouco empático. Obrigada pela leitura e comentário!
CurtirCurtir
Querida Sandra,
Diz um amigo meu que o tempo não existe, ele pode ser eterno em um segundo, ecoando em nossas memórias. Aprisionado em um momento de dor, seu eu poético fala do mundo, ao falar de si mesmo.
Muito bom.
Parabéns, sempre.
Beijos
Paula GIannini
CurtirCurtido por 1 pessoa
Obrigada pela leitura, Paulinha! Afiamos as palavras para o embate, para nos revelar, para nos confrontar com o que nos é imposto! Grata pelo comentário.
CurtirCurtir
Um chamamento para que se olhe também para o lado mais sombrio, que se encare as perdas geradas pela indiferença. Um alerta para que não se negligencie vidas, nem se cale lamentos mesmo tardios. Versos fortes, tristes, dolorosos que conduzem a um misto de raiva e desesperança. Parabéns pela clareza e força dos seus versos.
CurtirCurtir
Obrigada pelo seu comentário e leitura, Cláudia. O mundo anda muito triste e as pessoas, ainda mais, com tão pouca sensibilidade. Vamos em frente!
CurtirCurtido por 1 pessoa
Tempos de gente sem tempo para ser feliz, de gente sem tempo para dizer afetos, para sorrir abraços, para sentir o outro como a si mesmo. O mundo é um grande amontoado de infelizes e desavisados da vida – porque não há o entendimento do agora como presente, e do outro, perto ou longe também como alguém de carne e osso, de coração e verdade. O mundo virou um grande umbigo e o universo continua lá fora.
Parabéns pelo poema. Um grande e carinhoso abraço.
CurtirCurtir
Exato, Evelyn. O mundo virou um grande umbigo, disse tudo. Obrigada pela leitura e comentário !
CurtirCurtido por 1 pessoa