Chove
E eu, que já não sei chorar
Deságuo desato e derramo
Nas ruas de cetim, o sonho
Último, escasso, quase laço
No fim, eu sei, melhor assim
Canções ao breu. E eu? Luar
Parte é perda, parte é ganhar
Parto – calo, e violo as regras
E cega, mutilo, sigo as setas
Todo inverso, do que pretendo
Aprendo, choro, chove, relento
Lentos fluem sangue e sombra
Eu. Poeira, madrugada e silêncio
É tudo que eu tenho e é quase bom
Recolha suas minguadas escolhas
Feche os meus olhos, aceite e siga
Eis tudo o que se pode conter, ater
Ilusão. Sob o sol, nada há de novo
Sufoco. Sacrários. Sacrifícios.
Estranhamente canto o fim, e sim
A chuva de neon purifica, incendeia
Sem auxílio – hesito – o exílio exaure
Une as gélidas mãos e ora o que temia
Transcende as suaves palavras e louca
Louva excede intercede e é só.
Heresia.
Olá, querida Rothstein. Linda poesia, forte e intensa, assim como vc, que nessa fragilidade aparente, joga e derrota seus obstáculos. Eu vivo dizendo que poesia é de difícil interpretação. Digo isso não para me furtar a ler, mas por acreditar que cada pessoa que lê, vai ter uma visão muito própria e independente do resultado que o autor ou autora quis dar. Digo isso porque ao escrever poesias, recebo toda sorte de comentários, e muitos deles ou não compreendem o que escrevi, ou vão além e descobrem significados que nem eu enxerguei. Gosto da sua poesia, assim como da sua prosa. Você é grande, menina.
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Querida Renata,
Poema intenso que passa a desconstrução permanente e intensa do eu-lírico.
“Eu. Poeira, madrugada e silêncio”
Quero te parabenizar porque percebo que a própria desconstrução está fazendo com que teus poemas estejam cada vez mais nítidos – e não me refiro à compreensão sólida e fixa, porque isso não existe na poesia – no sentido de que remetem a símbolos e alegorias de um jeito menos internalizado e, por isso, cada vez mais próximo do leitor.
Um beijo
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Assim como na sua prosa, na poesia, as palavras chegam com força, com vida, intensas. Gosto muito de te ler pq vc tem uma escrita visceral. O poema não tem rima mas tem movimento porque as palavras, muito bem escolhidas, se completam. Parabéns. Bjs
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Renata, querida, que coisa mais linda esses versos que abrem seu poema:
Chove
E eu, que já não sei chorar
Deságuo desato e derramo
Nas ruas de cetim, o sonho
Último, escasso, quase laço
a imagem dessas ruas molhadas de cetim onde os sonhos se enlaçam me encantou. No final do poema o encanto ecoa na chuva de neon que purifica. Belíssimo, querida. Um beijo.
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Olá, Renata!
Concordo com a Iolandinha sobre o fato de cada leitor ter uma interpretação sobre os versos que um/a poeta escreve.
Dito isso, eu arrisco a minha interpretação. Há um encanto incomum nas escolhas das palavras nesse poema que trata de uma interpretação do eu-lírico, que se expõe diante dos reveses da vida e, apesar da ‘ poeira, madrugada e silêncio’, ela segue com o que tem, com a pessoa que é, com suas escolhas e sacrifícios. Assim, o eu-lírico segue, segura de si e do caminho que escolheu. Muito obrigada por esse poema grandioso! Amei. bjos
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Oi, Renata!
Não ouso interpretar o que talvez nem ao poeta se explica… não sei se é assim com você, mas há poesias que vão para o papel antes mesmo de se organizarem na mente.
Adorei a sonoridade, a sensação, a sutileza. A mim é muito.
Parabéns!
Um beijo!
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O poema propicia uma leitura ampla e crítica dos valores vigentes, como espaço de revelação e reconhecimento do prazer e da realidade circundante. Traz um tema bastante caro para nós, o ponto mais forte que temos enquanto comunidade. Que é sermos por nós mesmos.
A desumanização ou a desconstrução do eu é criada pelas imagens recorrentes da água (chuva, lágrima) que lavam e arrastam tudo o que é encontrado pelo caminho, os obstáculos. Mensagem densa e tensa, mas de esperança, pois o eu-lírico segue o seu trajeto
.
Versos curtos, sonoros, repleto de aliterações e conotações multissignificativas, estilo de quem realiza um trabalho especial.
Parabéns, Renata, pelo texto sensível, pelo olhar desassossegante que buscou explicar as questões tangentes da vida, em um diálogo com a poética perturbadora.
Beijos.
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Querida Renata,
“Chove e eu já não sei chorar…” Não há necessidade de interpretação para esta poesia-oração. O inviolável já se rompeu de forma tão vil… Este eu poético, não é apelo, não é desabafo, é constatação de braços largados na chuva enquanto as lágrimas teimam em não mais cair.
Parabéns.
Beijos
Paula Giannini
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A chuva e sua simbologia. A água que representa o emocional, o eu lírico que também deve chover por dentro, dissolvendo-se e misturando-se às águas que o rodeiam. Tudo é emoção, sentimento, fluidez de pensamentos. Seus textos sempre são marcantes, densos, profundos, que nos puxam como areia movediça para contemplemos o belo e o escuso também dentro de nós. Parabéns.
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Ah… Sei lá. Às vezes acho que é isso mesmo, uma volta para a esquerda e outra para a direita, um sair, um ficar, um não sei que na alma. É uma volta e uma revolta, é uma quase esperança e o cansaço no fim. Gosto do que leio, aqui. Porque tem movimento, tem força e meio que dá uma bofetada e um alento ao mesmo tempo.
Parabéns.
Abraços carinhosos.
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